"O VERMELHO E O NEGRO - Pequena Grande História do Flamengo" - Ruy Castro / Editora DBA
"Uma vez Flamengo Sempre... em flamejantes chamas!" (sic para o necessário pleonasmo)

©Alexandros Papadopoulos Evremidis*

Quem passasse pela Praça Santos Dumont, na Gávea, na noite de 27 de novembro, pensaria estar sonhando, tendo alucinações ou presenciando mais um acontecimento mágico na Cidade Maravilhosa. Era como se o Maracanã tivesse se teletransportado para a ilha de tranquilidade e bom gosto que é o restaurante Photochart, ali na lateral direita do Joquei. É que os alto-flantes irradiavam por toda a redondeza, a todo volume e plenos pulmões, o hino e os gritos da galera do time mais querido do mundo. Como que time?! Não se faça de bobo. Assim como só há um sol a reinar sobre o sistema, só há um time a inflamar os corações de todos os quadrantes do Planeta.

Quer saber se havia jogo? Se era Fla-Flu? Fla-Vasco? Fla-Botafogo? Não, era Fla-Fla mesmo. Flamengo, Flamejante. Flamante. Mengo. Mengão, amor e paixão de todo coração. Que nem o do Ruy Castro, jornalista de sucesso e escritor consagrado com livros sobre Bossa Nova, Nelson Rodrigues, Garrincha, Ipanema e até uma ficção, "Bilac vê estrelas" - inspirado no tal de "Ora, direis"? E que naquela noite mágica, abria seu coração e uma vez mais declarava eterno amor, lançando seu mais recente e definitivo livro "O Vermelho e o Negro - Pequena Grande História do Flamengo".

Enquanto as galeras, (da mais velha à mais jovem - o filho, do dono do Photochart, de uns 6 anos - idade que Castro também tinha quando caiu de amores pelo Mengão - estava lá todo posudo e orgulhoso e vestido a rigor - camisa 10!), iam ao delírio com o desfile dos ídolos-heróis, ele, coração descompassado e rosto vermelho (sintomático!) de emoção, autografava "Flamengo é nosso" e de quem quiser. Mas há quem não queira?! Só se for ruim da cabeça ou doente do pé ... que aí não dá para chutar a gol nem cabecear. Só que nessa noite, até vascaínos inveterados como o maître Ribeiro e os garçons, Zé Maria e Carlos, sucumbiram ao fascínio e renderam suas homenagens ao dono dos corações flamantes - Flamengo! Também pudera!, quando se trata de Flamengo ninguém é de ferro.

Para analisar "O vermelho e o Negro" de Ruy Castro, temos que recuar no tempo. Corria o ano de 1954 e a vida de um menino de seis anos, como de resto de toda criança brasileira, não tinha muito sentido: vivia pelos cantos, de pé no chão e dedo no nariz, na expectativa de uma revelação que ... lhe foi presenteada na transmissão pelo rádio de um jogo do Flamengo. A partir daí, abraçado a uma fé, tudo mudou. Tornou-se jornalista e escritor e...

Quando um homem, mesmo do quilate de Ruy Castro, com seu histórico profissional e intelectual, e sua maturidade, contando 50 e poucos anos agora, faz uma confissão como essa, ainda que corajosa, e uma profissão de fé de tamanho fervor, publicamente, como está na orelha do livro, preto no branco, não!, preto no vermelho, para literalmente todo mundo ver, ficamos com a pulga atrás da orelha: Ele é fan fanático e portanto suspeito! Ele é amante, flamante!, e como todo amante tende a enxergar dotes e qualidades inexistentes na amante. Ou pecar pelo exagero. A maior e a melhor do mundo! A mais bonita! A mais gostosa! A mais amada amante! E bota amante nisso - desde pirralhinho!

Mas logo, deixando Castro na geral e, com distanciamento e imparcialidade, examinando o histórico do Flamengo, vemos que por mais capcioso e tendencioso que ele quisesse ser, ou não pudesse evitar de ser, diante da avalanche da verdade, ele nunca conseguiria aumentar, embelezar e glorificar o que já está no superlativo. Não, não, Castro corre o risco, isso sim, de ficar aquém, nunca além na glorificação do glorioso glorificado. Sim, porque o livro dele é muito mais que uma passional e apaixonada declaração de amor a quem lhe deu régua e compasso - prumo e rumo! O livro dele, tirando a parte de causos e histórinhas, que arejam e hilariam o tema e onde curiosamente ainda assim é absolutamente objetivo e justo, é todo feito de datas e dados, números e estatísticas, fotos e facsímiles! - coisas criteriosas com que não se pode impunemente brincar, manipulando, corrompendo ou distorcendo a favor ou contra, sob pena de ser desmoralizado no primeiro corner, perder o penalti, ou pior, o gol feito. Se ele quisesse a tudo abarcar, e ainda por cima relatar um romance, teria que ecrever uma enciclopédia, tal a vastidão, amplitude e magnitude do tema flaminco.

Ruy Castro, amante "ma non troppo" para não perder o senso do real e do profissional - que antes de tudo ele é jornalista e escritor responsável! -, sabe disso e também disso faz profissão de fé - transmitir o que é, não o que desejaria que fosse. E o faz muito bem feito. Com rigor e maestria nos revela a gênese do (fosse eu místico e já estaria acendendo uma vela, pois neste exato instante, alguém lá da rua interrompeu o fluxo de meu raciocínio gritando carinhosamente "Meeeeeeeengo"! ... e um instante passado, outro, como a dialogar, respondeu: "Mengooo!!!" Que cachorrada, hein!)...

... dizia eu que Castro nos revela a gênese do Flamengo, há 3! séculos, lá nos idos de 1895 e nos faz acompanhar de perto os anos difíceis dos cueiros e da infância; depois, já a partir de 1911, em plena adolescência, quando o time de regatas incorpora o futebol do fluminense, Castro nos emociona e faz rir com a saga, ora dramática ora cómica, de como se contrói um mito e uma lenda! Só que tudo na real! Os arquivos dos jornais e a bibliografia, que Castro pesquisou meticulosamente, e ainda os troféus e os diplomas acumulados não o deixam mentir. E assim, de vitória em vitória, de glória em glória, de um ou outro fracasso, de ídolo em ídolo e de torcida em torcida, ele nos conduz pelas décadas e séculos até à maturidade e mais, até o corrente ano. Quando chegamos ao fim da leitura ricamente ilustrada, só nos resta sorrir e suspirar: É, de fato, Flamengo é o maior. E o melhor!

Quanto a mim, para limpar minha própria barra e não ser tachado de cooptado, declaro que sou flamenguista, sim, mas torço por todos, porque a vida assim é e é bom que assim seja! Mas numa coisa serei superlativo: Proponho, e com urgência urgentíssima, que a ONU declare o Flamengo "patrimônio cultural e esportivo da Humanidade!" E não é por mero capricho mas porque o Mengo é dengo. É esporte e é cultura. É estado de espírito. Estilo de vida! Modo de ser, de pensar e de amar. Incondicionalmente e apaixonadamente! Com alegria e desprendimento, com irreverência, com jeito de moleque, carnaval e samba, malandragam. Com liberdade, com paixão e entrega. Doação com sangue, carnes e músculos. Com pernas que ensinam como driblar, não o inimigo mas o adversário e os obstáculos e mazelas da vida, a fome e a tristeza. O desemprego e a corrupção. A injustiça social. Enquanto isso não é conquistado, o populacho do Flamengo nos diz como ser feliz com pouco ou nada e sentir que é dono do mundo. Flamengo não é o mundo? E o mundo não é flamengo, flama, chama, flamejante, fogo e paixão rubronegra? Flamante! E raça! Negra e vermelha!

É ler "O Vermelho e o Negro" de Ruy Castro para ver e crer que Flamengo é nosso! Nosso, quero dizer, de todo o mundo.

Rio de Janeiro 2002

Alexandros Papadopoulos Evremidis = > escritor crítico > Email


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