| Pina Bastos |
A linha da maturidade

© Alexandros Papadopoulos Evremidis

A pintura de Pina Bastos apela direta e prazerosamente para nosso senso estético - por seu balanço, sua harmonia e seu elaborado equilíbrio. Tudo muito apropriadamente configurado e distribuído pelo espaço - atributos desejáveis por quem aspira por uma comunicação pautada por ordem e constância, suavidade e delicadeza, simplicidade. Isso por ela não nos sujeitar ao desconfortável papel de idiotas boquiabertos, incapazes de entendimento. Não, aqui não há despropositadas complexidades em forma de enigmas e quebra-cabeças, nem elucubrações pseudo-intelectuais. O que há são formas e cores elementares, relacionando-se dinamicamente entre si e com o espaço em que se inscrevem, irrigados por um espírito juvenil comprometido com a emoção intermediada pelos sentidos. Você vê e você gosta. Olhando melhor, você se encanta, envolvido que se sente pela matéria pictórica, cúmplice orgânica que é.

Está claro, entretanto, que toda arte também pede, não, exige algum nível de entendimento. E nesse sentido, Pina nos remete a questões mínimas da história da arte, que, uma vez solucionadas, permitem, a ocorrência do tal deslizamento e transbordamento, de que se compõe o mecanismo estético gamado à sensibilidade.

Forcemos um grosseiro raciocínio: o artista não gosta da vida e do mundo, e aqui vai um belo clichê, como eles são - ilusórios, enganosos, efêmeros, confusos e distorcidos; na verdade, o caos persiste. Ele pega então um punhado desse caos e, ordenando e conferindo-lhe significados, cria um microcosmo ideal. É seu momento de demiurgo supremo e soberano. Para tanto, foi preciso que penetrasse a intimidade dos objetos para conhecer-lhes a essência, o espírito subjacente - a beleza das poucas formas e das poucas cores de que tudo e todos são resultantes.

Pina, sabedora de que os trogloditas, antes mesmo da articulação da fala, já grafitavam adoidado, fez coro com Platão, para, pela boca de Sócrates, nos dizer da sublime beleza das formas. Não as das figuras vivas, mas as dos planos ou sólidos produzidos pelas linhas retas e curvas com o auxílio da régua e do compasso. Elas são bonitas, não por uma razão ou propósito particular, mas por sua própria natureza. E nos proporcionam prazer, da mesma forma que as cores dessa espécie.

Pina é certamente íntima do Suprematismo de Malevich, que, em 1913, mais de dois milênios depois, portanto, produziu pinturas compostas dessas formas geométricas, chegando mesmo ao paradigma radical, primeiro, de um quadrado negro sobre um fundo branco, e, depois, em 1918, extrapolando geral, de um "branco sobre branco", ficando a distinção por conta do brilho e da opacidade. "Em minha desesperada tentativa de libertar a arte do lixo do mundo objetivo, refugiei-me na forma do quadrado".

Finalmente, Pina é também cúmplice de Mondrian, do De Stijl e do Neo-Plasticismo, na simplificada geometria do mais e do menos, dos planos e das elevações a que reduziu suas macieiras; e ainda de Hélion, Herbin, Kupka, Tatlin, ... desembarcando com Albers e Moholy-Nagy em Bauhaus/Weimar. Vê-se que companhia mais invejável e desejável, Pina não poderia ter. "Trabalho com a linha", declara, ciente e orgulhosa. E é com essa linha e suas retas e arcos que ela forma triângulos, círculos, elipses, esferas, cubos (palavra que nos lembra que as abstrações geométricas são decurso do cubismo, onde Pina também tem um pé), cones, espirais que sugerem o tom agitado de sua movimentação interior. Sendo que, apesar de toda economia formal, aqui e ali, cria estruturas tridimensionais e planos inusitados que, por complexos, ora se interceptam ora se interpenetram e ora se delimitam, na conquista do espaço em sua profundidade.

Emprestando gravidade maior às linhas do que aos planos que as contêm, ela exaure seu propósito, desenvolvendo-o até as últimas consequênccias - a expressão da realidade pura, com seus atributos constantes de harmonia, equilíbrio e balanço, de que falávamos no início, que, aliados às cores básicas, eliminam o subjetivo e validam o universal.

Embora a semelhança fonêtica do nome Pina Bastos seja distante de Pina Bausch, a afinidade artística é bem próxima - ambas se movem e são movidas pelo ritmo da poesia, da música e da dança. Pina no espaço de Pina.

Rio de Janeiro 2003

©Alexandros Papadopoulos Evremidis > escritor crítico > Email


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