| Santos quase todos by Ana Durães |

Todos Quase Santos

©Alexandros Papadopoulos Evremidis*

"(...) Ó, Santa Luzía, conservai a luz dos meus olhos para que eu possa ver
as belezas da criação, o brilho do sol, o colorido das flores, o sorriso das crianças.(...)"
Trecho da prece de Ana Durães.

Vejo um coração escarlate bordado nas costas da blusa de Ana Durães e instintivamente envolvo e acaricio-o com a mão. Suave e delicadamente. Pergunto se é ele o "Sagrado Coração". "Mas é claro que sim!", ela se vira para mim e exulta confirmando. E portanto confirmado está. No rosto, um largo, doce e inocente sorriso de menina, acolhedor e aconchegante, e intensa luz. Digo-lhe então que pinte um autorretrato e o inclua na exposição, já que também ela é, e leva todo jeito, uma santinha. Que um dia será santa. Das artes! Não foi para isso que ela pediu à Outra a conservação de seus olhos, para repensar e recriar o mundo (melhor do que este aqui)?!

Sim, porque se santidade é a quase perfeição - já que a absoluta não existe, salvo na figura de Deus que a valida com sua absoluta ausência! - em humanos termos, o que por sua vez implicaria em mudança do título para "Todos Quase Santos", Ana Durães atingiu essa quase perfeição em seu fazer artesanal e em sua arte, complexa em seu despojamento e simplicidade. E não apenas pela qualidade intrínseca dos suportes mas também pela ousadia - que é isso de pintar surrados santos hoje em dia - um tema exaustivamente processado por bizantinos, russos e renascentistas, para só citar os corifeus da iconografia. Foi sem dúvida um risco calculado, esse de resvalar para o déjà vu e para o "kitsch" - para a mistificação do já mistificado. Mas afinal, as estórias do Édipo, do Crucificado e do Hamlet mostram que os diques aí estão para serem rompidos. Foi o que a corajosa e, nesse sentido, iconoclasta Durães fez.

Agora falando da mostra em si, Durães resgatou os populares santinhos disto, disso e daquilo (onde estão os dos sem-terra, dos sem-teto e dos sem nome mas com toda fome?!), vulgarizados como moeda comum e corrente, a ponto de virarem marca até de políticos que prometem água e esgoto mas que acabam por furtar a água e nos inundar com esgoto. E em profusão.

Resgatou-os, dizía eu, pelo artesanal processo da impressão em cianótipo sobre pele e "entronizou-os" em caixinhas-santuários etereamente iluminados. Um achado, sem dúvida, muito bem bolado! Mas o forte está na telas grandes em que se serviu de técnica mista sobre tela ou vinilona alcançando efeitos insuspeitados de libertação dos estereótipos, no croma, na forma e na matéria - sinal de maturidade. Curiosamente, e com familiar cumplicidade e intimidade, despojou-os de sua santidade, dando-lhes, a quase todos, nomes seculares - Jorge, Gorete, Sebastião (Por que não Tião?), Luzía, Bárbara... Também isso é bárbaro. Assim como, e principalmente, a sua adorável "Quase Santa"... una putana?! Sem falar na própria Bárbara, de uma beleza e sensualidade estonteante, celestial e a um tempo mundana, nunca antes vista e materializada, em tempo e espaço algum, com tamanha maestria! "Cum laude" para Ana Durães, que há de durar e maturar.

Rio de Janeiro 2001

©Alexandros Papadopoulos Evremidis > escritor crítico > Email


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