ALBERTO NICOLAU | Pinturas |
A invasão da Normandia pelos pincéis do menino do dedo verde (e vermelho e azul e amarelo e ...).

©Alexandros Papadopoulos Evremidis*

Pródromo: Olhe só para que incontidas e irreprimíveis reflexões esse rapaz me levou.

Primeiro: Caí de pára-quedas no vernissage e sem nenhuma referência, o que é lamentável e imperdoável, mesmo com o concurso do álibi socrático de sabendo mais, sabe-se menos. Está certo que a "koiné" enxerga apenas a ponta do nariz e se protege na ilusória segurança do mundinho e só muito eventualmente lança o olhar ao horizonte e ao capitólio. Além não passa - não rompe a casca azul, não nasce, não penetra nas insuspeitadas maravilhas (não esquecer de dizer que horrores não há) do infinito. Por medo da distância, do frio, do escuro mais puro, já que o fiat lux lá não chegou? Quem muito estuda e passa, paga o justo preço de, na exata proporção do inversamente proporcional, entender o quão pouco entende e apreende da terrífica e excitante imensidão.

Segundo: Ao chegar ao topo da escada-rolante do Rio Design Leblon e meu olhar bater de frente com as aquelas suas pinturas, na vitrine da Votre (notre? merci!) e nos corredores, senti um ligeiro, porém chocante, tremor - mas o que é isso? intrigado me perguntei e incontinenti e em voz alta exclamei "ninguém mais pinta assim!" E por que não? me provoquei e repliquei: Porque a arte de hoje em dia é (tem que ser?) contestatária. A dialética tréplica me veio como um insight na forma de um tapa nos suportes internos da cara e outro, nos da coroa absolutista: E por acaso, não era contestatário e transgressor e demolidor, em tempos sombrios, como os que estamos vivenciando - na carne viva, imbuída do logos, aqui, em casa, e alhures -, ele atacar de superlativa beleza?!

Terceiro: Fui então, pensando "Temos um francês aqui", peregrinar pelos tableaux e, escandalosamente gemendo de prazer, me deixei subjugar e, em delírio, arrastar por um orgíaco orfismo que transpirava do que me pareceu serem paisagens, construções, habitações, interiores - acidentes e contingências da engenhosidade da natureza e dos humanos. Eu disse "pareceu", porque a sensação que me dominou foi a de que a forma ali, embora familiar e reconhecível, era o de menos, mera, meríssima função da cor - da chuvarada de cores! Mas não aleatórias e tampouco gestuais, "au contraire", equânimes e meticulosas, "presque" cientificamente assentadas no suporte. E ainda assim com toda e passional devoção. Com espontânea liberdade.

Terceiro e 1/2: Sim, amizade, não me constranjo nem contenho em dizer (o que me ocorreu na hora) que esse rapaz sofre de uma anomalia visual que faz com que ele enxergue cor em tudo, melhor, que enxergue todo o mundo objetivo em forma de cor - não importa que seja lama, pedra, árvore, muro, parede, casa, tapete, corrimão, copo, faca, animal, pessoa, para ele tudo são cores. Eu disse cores? Não, corrijo - para ele tudo são multicores flores! Por instantes, imaginei-o como uma borboleta que, onde quer que, além das flores, pousasse, deixasse flores e mais flores. E também foi forçoso, por humanamente inevitável, recordar do menino do dedo verde do Druon que onde apusesse o polegar nasciam flores (na boca dos canhões). Daí a infame piada (?) - a autoridade (ela mesma uma, ainda que espinhenta, florzinha) deveria contratá-lo para acariciar as AR15 dos bandidos - dos assumidos e dos disfarçados fardados. E ainda, quem sabe, enviá-lo para a Judéia e para Gaza (onde a paz no túmulo jaz) e também encarregá-lo de puxar a orelha do Bush, apertar o nariz do Bin, beijar a boca do to be or not to be.

Quarto (e não é de dormir, é de brincar): Brinco com isso, porque aí pelas tantas eu quis saber quem era ele e trocar uma figurinha. Nem precisei me socorrer com a Eliane, a das honras da casa. Ao passear o olhar pela massa dos presentes, quase todos devidamente mastigantes e ruminantes, o The Flash, por parecer um "flesh" em agitada movimentação, deteve meu olhar - olhos brilhantes, rosto afogueado, veloz deslizava pelas diagonais e pelos meándricos interstícios possíveis e abraçava e beijava e posava para retratos, uma palavra amável e gentil para todos que, estava na cara, o amavam e isso era (é, para todos) uma noite de glória! Parecia um menino pela primeira vez (nesses casos, toda vez é a primeira vez) num parque de diversões.

Chega! Falemos com ele (embora nada mais houvesse sobre o que falar). Ficamos então sabendo ser brasileiro morando há alguns anos na Normandia. Ah, bom! E, para não perder o costume, brincamos: "aceitava ele a tachação de ter feito uma pintura francesa?" Entendendo o espírito, entrou na brincadeira - "está certo, a paisagem é francesa, o estilo é francês, mas a cor é brasileira!" - se garantiu orgulhoso. Bem que eu estava desconfiado, mas não o jornalista gaulês que me acompanhava e que se insurgiu - "na França também temos essas cores fortes". Mas não é o forte de vocês, gozei e encerrei o banho de abundante e exuberante cor e de sublime beleza. Invasão por invasão, prefiro esse tipo de invasões. Que venham + e melhor! Bravô, Nicô!

Rio de Janeiro 2004

©Alexandros Papadopoulos Evremidis > escritor crítico > E-mail


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